O prazo de validade da medida protetiva sempre foi fonte de aflição para as vítimas de agressão
Grande parte das mulheres vítimas de violência doméstica vivem, ao receber a notícia de que foram deferidas as medidas protetivas em desfavor do seu agressor, um alívio e uma nova angústia.
O alívio vem de saber que daquele momento em diante detinham uma medida em seu favor, que afastava o seu agressor, com a segurança jurídica de que o descumprimento das restrições impostas acarretaria graves consequências, podendo o violador da medida até mesmo ser preso preventivamente.
No entanto, há também a angústia de ler, na mesma decisão que decretou as medidas, o seu prazo de vigência. Saber que aquela medida de segurança era temporária e que dentro de poucos meses perderia sua validade era aterrorizante.
Muitas anotavam em seus calendários o derradeiro dia em que as medidas se encerrariam e, em seu íntimo, rezavam para que este dia tardasse em chegar. Sabiam que era possível pedir a prorrogação das medidas, mas questionavam, qual era a certeza de que seriam prorrogadas? O que poderia acontecer no dia seguinte ao encerramento das medidas? Como se comportaria o agressor ao saber que daquele dia em diante poderia se aproximar novamente da sua vítima e, até mesmo, restabelecer contato?
O Superior Tribunal de Justiça soube compreender essa aflição e, no julgamento do Tema 1.249 dos recursos repetitivos, decidiu que as medidas protetivas da Lei Maria da Penha poderiam ser por prazo indefinido. A protetiva deve durar o tempo em que existir o risco e não um prazo aleatoriamente estabelecido.
É importante destacar que o novo entendimento do STJ encontra respaldo legal, pois a Lei nº 14.550, de 19 de abril de 2023, alterou a Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006 (Lei Maria da Penha), incluindo três novos parágrafos ao artigo 19 da Lei Maria da Penha, que trata dos requisitos para concessão das medidas protetivas.
Dentre os novos parágrafos, foi estabelecido que as medidas podem ser concedidas independentemente da tipificação penal da violência, do ajuizamento de ação penal ou cível, da existência de inquérito policial ou do registro de boletim de ocorrência, e devem vigorar enquanto persistir o risco à integridade física, psicológica, sexual, patrimonial ou moral da vítima, ou seja, tornando possível com que as medidas protetivas sejam concedidas por prazo indeterminado e durem o tempo em que a vítima estiver em situação de risco.
O entendimento agora consolidado pelo STJ demonstrou sensibilidade ao perceber que a obrigatoriedade da vítima em ter que, periodicamente, requerer a prorrogação da medida gerava revitimização.
Deixar de estabelecer um prazo determinado de vigência para as medidas protetivas não prejudica o direito do acusado, pois ele poderá a qualquer momento provocar o juízo de origem, quando entender que a medida inibitória não é mais pertinente.
Devemos ter claro que o fato de a medida não ter um prazo definido de vigência não permite que se tenha uma duração ad eternum, o que nitidamente violaria os direitos do acusado. A medida protetiva deverá permanecer em vigência enquanto persistir o risco que se visa coibir, por prazo indefinido e não perpétuo.
Em que pese a violência contra a mulher ainda crescer no Brasil, o entendimento agora consolidado pelo STJ traz consigo um pequeno alívio às mulheres vítimas de violência doméstica, hoje protegidas por uma medida protetiva.
É importante recordar que as medidas em vigência não serão automaticamente convertidas para o prazo indefinido e que as medidas que futuramente serão concedidas não estão obrigadas a estabelecer o prazo indefinido. Caberá sempre à vítima e ao seu defensor requerer a aplicação deste novo entendimento.