As Câmaras Municipais têm a oportunidade de saírem na frente e viabilizar a maior participação da população em decisões políticas importantes
Tradicionalmente as decisões na democracia são concebidas sob duas perspectiva: a direta e a representativa. Na democracia direta o povo escolhe o que quer para si (a política pública, a lei, o ato administrativo, etc). Na representativa, o povo escolhe os representantes, os quais, por sua vez, escolhem a providência pública que será concretizada. Esses modelos podem conviver, com maior grau de presença de um ou de outro, e quando um apresenta insuficiências, o outro abre-se como caminho alternativo para preservar o regime democrático.
Argumenta-se que a democracia direta somente seria possível em pequenas comunidades com alguma homogeneidade cultural, em que os cidadãos, efetivamente, têm tempo para cuidar dos assuntos públicos. A democracia da Atenas antiga seria o exemplo dessa prática. Mas, não se pode ignorar que essa vivência democrática era excludente, por não considerar cidadãs as mulheres e os estrangeiros, sustentando-se sob o regime de escravidão.
Em contrapartida, pondera-se que a democracia moderna somente poderia funcionar sob o formato da representação, em razão do pluralismo de concepções morais, religiosas, filosóficas e culturais e da expansão do demos, ou seja, do número de pessoas habilitadas a participar o processo público de decisão. Em democracias não homogêneas, com muitos atores e eleitores, a maioria deles ocupados de seus interesses privados, não seria possível a democracia direta.
No caso brasileiro, existem diversas formas de participação direta do povo nas decisões coletivas, embora não sejam utilizadas rotineiramente. Se a pouca frequencia com que o povo vale-se desses mecanismos de participação deve-se ao baixo engajamento dos cidadãos, ou às dificuldades institucionais que são impostas à participação popular, é uma questão sem resposta definitiva.
O certo é que o legislador constituinte viabilizou, através da Emenda Constitucional n.º 111/2021, as consultas populares municipais, as quais tem o potencial de incrementar a atuação do povo e, quiçá, aproximá-lo das decisões a serem tomadas nas Prefeituras e nas Câmaras de Vereadores. Eis o que dispõe a referida Emenda:
“Art.14………………………………………………………………………………………………………
§ 12. Serão realizadas concomitantemente às eleições municipais as consultas populares sobre questões locais aprovadas pelas Câmaras Municipais e encaminhadas à Justiça Eleitoral até 90 (noventa) dias antes da data das eleições, observados os limites operacionais relativos ao número de quesitos.
§ 13. As manifestações favoráveis e contrárias às questões submetidas às consultas populares nos termos do § 12 ocorrerão durante as campanhas eleitorais, sem a utilização de propaganda gratuita no rádio e na televisão.” (NR)
As Câmaras Municipais têm papel essencial na condução do processo que possibilita a realização da Consulta Popular, devendo regulamentar o tema localmente e dar concretude à constitucional, uma vez que já estão dadas as balizas constitucionais no sentido de que as consultas deverão ser realizadas em concomitância com as eleições municipais, bem como observar, o regramento geral sobre consultas populares em geral.
A Consulta pode ser utilizada nas várias eleições municipais, não só naquelas em que se elegem vereadores e prefeitos, mas, também, nas eleições para conselheiros tutelares, ou, em outros tipos de eleições e consultas estatuídas por lei ou regulamento municipal.
As Câmaras Municipais têm, agora, a oportunidade de saírem na frente e viabilizar a maior participação da população em decisões políticas importantes, desonerando os vereadores do ônus de tomarem decisões que, por vezes, contrariam a vontade do povo, já que uma gama significativa de temas polêmicos podem ser submetidos diretamente à legitimação popular.