CRÉDITO: PLURAL.JOR.BR

Uma análise crítica da decisão paradigmática da Justiça Federal do Rio de Janeiro

No final do ano 2021 introduziu-se no direito marcário brasileiro uma nova forma de diferenciar bens ou serviços, em relação aos seus concorrentes, chamada marca de posição.

A marca de posição engloba um sinal distintivo localizado em um ponto específico do suporte, resultando em conjunto distintivo capaz de identificar produtos ou serviços e distingui-los de outros idênticos, semelhantes ou afins, desde que a aplicação do sinal na referida posição do suporte possa ser dissociada de efeito técnico ou funcional.

Regulamentada no Brasil pela Portaria nº 37/2021, do Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI), dita normativa permitiu, inclusive, que pedidos de registro anteriores à norma pudessem ser alterados para essa categoria. A Portaria nº 37 logo foi sucedida pela atual Portaria nº. 08/2022, que regulamenta a marca de posição a partir do seu artigo 84 e seguintes.

Em maio de 2023, o INPI concedeu o primeiro registro para marca de posição no Brasil para a Osklen, empresa varejista de artigos de vestuário e acessórios, criada em 1989, protegendo os clássicos “três furos” na parte frontal do famoso tênis da mesma marca.

Entretanto, na mesma oportunidade, o INPI indeferiu o pedido de registro para a marca de posição relativamente ao icônico “solado vermelho” aplicado a calçados femininos de salto alto, da grife francesa Christian Louboutin (processo n° 901.514.225).

O indeferimento foi fundamentado por suposta falta de distintividade do sinal reivindicado como marca de posição, com base nos artigos 122 e 124, VIII, da Lei de Propriedade Industrial (Lei nº. 9.279/96) cumulados com o parágrafo único, do artigo 84 da Portaria INPI/PR nº 8/2022.

A Clermon et Associes, atual registrante e licenciante do portfólio de propriedade intelectual da Christian Louboutin em todo o mundo, ajuizou ação de nulidade contra o ato do INPI, que indeferiu o pedido de registro de marca de posição.

Em resumo, a empresa autora apontou falta de fundamentação na decisão de indeferimento. Ainda, alegou que seria impossível imaginar um calçado de alta costura, com solado vermelho, sendo dissociado da autora, demonstrando sua evidente distintividade.

De partida, a Juíza Federal da 13ª Vara Federal do Rio de Janeiro deferiu o pedido liminar pleiteado para determinar a suspensão do ato administrativo de indeferimento até a decisão final no processo.

Recentemente, em novembro de 2024, o processo foi sentenciado, sendo acolhidos os pedidos iniciais da autora Clermon et Associes, para declarar a nulidade do ato administrativo de indeferimento para a marca de posição de titularidade da autora.

Em suas razões de decidir, a sentença destacou o resultado de pesquisa de mercado colacionada nos autos, feita com centenas de consumidoras brasileiras acima de 16 anos (público-alvo de sapatos femininos de salto alto) de todas as classes sociais e regiões do Brasil, em que restou claro que a maioria das entrevistadas associou o solado vermelho do sapato de salto alto a uma única marca, qual seja, a Louboutin, evidenciando seu alto grau de distintividade.

Segundo decidiu-se, “a fama e a reputação dos sapatos femininos de salto alto de Louboutin fizeram com que os consumidores passassem a identificar essa característica visual a tal produto, e não como uma simples cor de solado”. Assim, arrematou o juiz, “a marca então adquiriu distintividade com esse uso, no fenômeno chamado distintividade adquirida ou secondary meaning”.

A decisão em análise representa um marco importante na proteção de ativos de propriedade intelectual de marcas de moda, ao reconhecer que quando uma marca cria um produto icônico, que possui suficiente distintividade (como o solado vermelho) e alcança notória reputação perante consumidores de moda, ela deve ser protegida pelo sistema marcário e pelo Poder Judiciário.

Ainda, a pioneira decisão coloca o Brasil em pé de igualdade perante outros países que já reconheceram a proteção de marcas de posição e efetuaram o registro do solado vermelho da marca Louboutin.

Os amantes da moda e do bom Direito Empresarial comemoraram o acerto da decisão em destaque, que deve, ao que tudo indica, pautar outros casos semelhantes, e influenciar as próximas decisões a serem tomadas pelo próprio INPI. A conferir!

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